Este mês, refletimos sobre a resiliência e a superação do trauma. Descubra o que é a resiliência, como se relaciona com o trauma e de que forma podemos tornar-nos mais resilientes face à adversidade.

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Quando algo de muito difícil acontece nas nossas vidas, é possível que, em datas que assinalam o acontecimento ou noutros momentos específicos possamos re-experienciar sentimentos e pensamentos difíceis e que a memória insista em trazer consigo imagens, lembranças e sensações desconfortáveis, como uma maré que traz à costa objetos que poluem uma praia imaculada.

Isto leva-nos a refletir sobre as noções de trauma e de resiliência. A resiliência psicológica consiste em adaptarmo-nos com sucesso a uma experiência de vida difícil ou desafiante. No contexto do trauma, a resiliência refere-se à capacidade de lidar com ou ser capaz de ultrapassar uma situação potencialmente traumática.
Na realidade, quando falamos de trauma, não se trata da experiência em si, mas sim da incapacidade de recuperar dessa experiência. É a forma como emocionalmente respondemos à situação, a forma como pensamos sobre ela, como a ultrapassamos, ou como a "arquivamos” em nós, que fará a diferença. Neste contexto, a resiliência pode ser desenvolvida quando nos conseguimos adaptar do ponto de vista emocional, mental e comportamental. Naturalmente, a resiliência não é um traço fixo, ou seja, algo que se tem ou não se tem. A resiliência pode ser trabalhada e desenvolvida ao longo do tempo.
É também importante referir que ultrapassar uma situação traumática não significa que estamos a ignorar o passado ou que não fomos afetados pela situação. Não significa que estamos a varrer para debaixo do tapete e fingir que nada aconteceu. Não se trata de minimizar ou relativizar a situação traumática vivida.

O trauma pode resultar em emoções extremamente difíceis como a culpa, a vergonha, a raiva e a tristeza. E a regulação emocional pode permitir a expressão e gestão emocional de todas estas emoções, de forma mais saudável.
Assim, ser resiliente não significa que não experienciamos stress ou sofrimento, mas implica trabalharmos e desenvolvermos os nossos recursos através desta dor emocional e sofrimento. Construir resiliência leva o seu tempo, implica coragem, e apoio dos que nos rodeiam. Depende de fatores internos e mais pessoais, como a auto-estima e a nossa capacidade de comunicação, mas também de fatores externos, como o apoio social e os recursos de que dispomos.

Algumas formas que podem contribuir para reforçarmos a nossa resiliência são:

  1. Procurar apoio social:
    A pessoa só existe no seio de um contexto. Assim, um ambiente em que nos sentimos cuidados, quer seja na família, escola, local de trabalho, comunidade, fará toda a diferença;
  2. Descobrir o seu propósito e ajudar os outros:
    São formas que podem reforçar a resiliência, seja a dar uma ajuda adicional a alguém próximo ou a fazer voluntariado numa área que goste. Quando somos altruístas por vezes conseguimos perceber o nosso propósito, e simultaneamente sentimo-nos mais ligados aos outros;
  3. Lembrar-se do auto-cuidado:
    Cuidar de si a vários níveis é muito importante, pois irá contribuir para conseguir ultrapassar momentos difíceis. O auto-cuidado pode envolver usar a música ou a arte para se expressar, escrever num diário, fazer uma atividade que goste, passar tempo na Natureza, meditar, entre outros;
  4. Capacidade de aceitação:
    É difícil aceitar certos acontecimentos que nunca pensaríamos que nos batessem à porta. A verdade é que sermos capazes de aceitar que a realidade mudou, vai ajudar-nos a recuperar de uma situação traumática. Mesmo que fique uma marca muito grande e que vejamos a vida de outra perspetiva, aceitar irá tornar-nos mais resilientes.
  5. Procurar ajuda profissional:
    Pode ser necessário procurar profissionais de saúde mental e treinados na área do trauma, que consigam ajudar a lidar com o sofrimento psicológico e a desenvolver estratégias de regulação emocional que contribuam para a construção da resiliência, após uma situação traumática.

Enquanto uma comunidade que vive a ética do Islão através de valores como a paz, a irmandade e o serviço ao Jamat, podemos fazer a diferença. Somos uma comunidade marcada pela adaptação constante, fruto de movimentos migratórios do passado e do presente, de adversidades vividas pela mudança dos tempos. Sem dúvida, que temos sido capazes de encontrar recursos internos admiráveis, com uma abertura ao novo, uma filosofia pluralista e uma orientação para o futuro, sempre guiados pelo nosso amado Imam. 

Que a reflexão sobre os momentos difíceis das nossas vidas nos ajude  a construir resiliência, enquanto comunidade.


Soraia Jamal | Psicóloga