Nos dias que correm, a gestão do tempo é um fator a ter em consideração em muitos aspetos da nossa vida. Seja no trabalho, no trânsito, a descansar ou a educar os nossos filhos, de onde vem a ideia de que 15 minutos são suficientes? Não podem ser 20? E são 15 minutos diários ou bi-diários? A verdade é que não interessa o tempo, interessa a qualidade, mas outra verdade é que a qualidade implica tempo! Confuso? Vamos então refletir um pouco sobre isto.
Todos nós sabemos, não é preciso ser educador ou psicólogo, que a base de um adequado desenvolvimento emocional é a interação, que deve ser ajustada às características e necessidades das crianças. Quando estamos a falar de um recém-nascido, é um bocado mais fácil, porque os sinais são evidentes: quando algo não está bem, o bebé chora e os pais estão junto dele até voltar a sossegar. Mudam a fralda, alimentam, cantam, dão colo… enfim, despendem o tempo necessário até assegurarem que o bebé está novamente equilibrado e feliz. Mas à medida que as crianças crescem, os sinais nem sempre são assim tão evidentes e se os pais não estiverem atentos, podem deixar escapar indicadores que mais tarde vão perceber serem preditores de distúrbios emocionais. Então os pais devem estar permanentemente a perguntar aos filhos se estão bem? Ou devem viver exclusivamente para os filhos? Claro que não! O importante é que cada família interaja o tempo necessário para que todos se sintam à vontade para partilhar necessidades, aspirações, medos ou frustrações! O importante é que cada um conheça todos os membros da família, de modo a que nem seja necessário falar para se saber quando algo não está bem. E para que isto seja possível, todos os dias, ao longo de toda a vida, têm de existir interações ricas e diversificadas. Têm de existir momentos de aprendizagem, de pura diversão e até de repreensão. Tudo isso faz parte do processo de educar e é importante que estejam presentes na vida das crianças de forma harmoniosa. Esta harmonia constrói-se numa base diária e, decididamente, não significa cinco minutos para ajudar a fazer os trabalhos de casa, mais cinco minutos para ralhar e outros cinco para brincar. Significa estar-se disponível para suprir, eficientemente, as necessidades da criança naquele momento, demore o tempo que demorar. Esta ideia de tempo de qualidade não pode nunca justificar a falta de tempo mas, muitas vezes, é isso que está a acontecer.
É certo que a nossa sociedade tem mudado muito e a uma velocidade estonteante: as avós, que antes eram um grande suporte à família nuclear, estão agora ainda a trabalhar; os pais estão muito tempo fora de casa, em atividades laborais cada vez mais exigentes e competitivas; a escola já nem sempre é aquele lugar familiar e securizante; as brincadeiras na rua foram maioritariamente substituídas por jogos solitários, muitos deles online… enfim… podia continuar esta lista mas não é necessário. Tudo isto, nós temos de aceitar, porque o tempo não volta atrás! No entanto, estas mudanças não têm de ser fatídicas! Enquanto pais, o importante é a tomada de consciência da forma como estamos a agir e mudar! Há muita coisa que está perfeitamente ao nosso alcance: podemos fomentar refeições em família, sem televisão ou telefones por perto; podemos criar uma noite semanal dedicada a jogos ou filmes para todos; podemos partilhar as tarefas domésticas; podemos planear, em conjunto, visitas a museus ou passeios em família; as crianças podem transmitir à família o que aprenderam naquele dia ou numa determinada disciplina e os pais podem fazer o mesmo em relação ao resultado do seu trabalho… o importante é que a interação seja bidirecional e que todos - pais e filhos - tenham um espaço e um tempo para ouvir e para falar e que, após uma palavra mal dita ou um ato irrefletido, exista uma reflexão partilhada e um pedido de desculpas.
Resumindo, e porque afinal não é assim tão confuso, não me parece que se possa atribuir um tempo mínimo ou máximo para interações de qualidade. O que me parece realmente importante é assegurar que a interação perdura na vida da criança muito para lá do tempo real e objetivo. Se me perguntarem, digo que a qualidade da interação se deve medir pelo brilho nos olhos e pela certeza de se ser amado, todos os dias da nossa vida (mesmo que, em alguns dias, não existam nem 15 minutos de atenção individualizada).
Sandra Leal
Sandra Leal é licenciada em Psicologia, na área educacional, pelo ISPA, e Mestre em Educação Especial, pela FMH da Universidade Técnica de Lisboa. É psicóloga em contexto escolar, especial e regular, desde 1999 e Coordenadora do Centro de Recursos para a Inclusão (CRI), da APPACDM de Lisboa, desde 2012.